Lucubrações Macabras
O causo do meu amigo “Ogan”
Kelôlô*
Entre os bons amigos que eu tinha na época um dos mais
interessantes era o Kelôlô, pau pra toda obra, sempre atento as coisas e um
amigo de verdade. Kelôlô era feito de santo e seu pai de santo também era meu
amigo, uma pessoa de difícil trato, porem de bom coração, infelizmente hoje
ambos falecidos.
Kelôlô tinha feito santo, mas não dava santo e ai começou a aprender
tocar e cantar e por isso ganhou o apelido de Ogan e por ser uma pessoa que
tinha oficio e uma situação confortável sempre que podia ia à casa dos amigos, ajudava
durante as festividades sem cobrar nada, ia por prazer em ajudar os amigos.
Isso acontecia muito nos antanho, antes da profissionalização. Tínhamos uma
amizade muito próxima, mesmo sem nenhuma função em minha casa Kelôlô aparecia
pra um papo sempre regado a cerveja.
Eu sabia de sua relação complicada com seu pai de santo que era
uma pessoa temperamental, mas Kelôlô conseguia levar tudo numa boa. Vinha e
reclamava mas seu terreiro era sua vida e ele mesmo brigando com seu pai não o
deixava na mão nunca. Até que um dia ele chega em casa aperreado e :
- Baba hoje to meio puto e vim aqui descarregar, por favor,
me ouça e veja se isso esta certo.
- Diga meu bom, sabe que nossa amizade é forte.
- O senhor sabe que sou um filho de santo fiel a meu pai,
nunca deixei ele na mão, to sempre que posso ao lado dele ajudando.
- Sei sim e tenho certeza disso, continue.
- Então, veja bem ontem eu fui la fazer umas coisas,
terminei e já ia embora, me despedi dele e estando tudo bem sai. Peguei meu
carro e fui em frente e quando cheguei na esquina da rua vi minha irmã de santo
indo a pé na mesma direção. Dei uma parada e perguntei aonde ela ia e se eu
podia ajudar. Por acaso ela ia na mesma direção e ai abri a porta e ela entrou
e la se fomos nós, até ai nada de mais né ? Mas uma das velhas da casa me viu dando
carona pra ela e foi direto nos ouvido do pai de santo fazer inferno.
- Kelôlô meu filho infelizmente isso sempre acontece mas...
- Putz Baba eu deixei ela no lugar que ela ia e fui embora
pra minha casa. Cheguei em casa e tinha um recado do pai de santo pra ir la correndo,
porra Baba, eu tinha chegado dela, mas mesmo puto voltei correndo no terreiro,
e ai veja só.
O pai de santo estava muito macho, sabe me botou abaixo de
cachorro falou que eu saia sorrateiro e pegava as filhas de santo na esquina
pra levar pra motel. Não me deixou falar nada e ai falou que eu daquele dia em
diante estava suspenso de tudo no terreiro e pra mim sair e só voltar se ele me
chama-se. Baba ele virou as costas na cara dura e entrou pelo corredor e me
deixou ali. Eu estava sem saber o que fazer e ai uma ebomi veio falar que ele já
tinha me mandado embora e era pra mim ir.
- Poxa vc esta encrencado mesmo, seu pai não te deu chances de
nada, mas olha ele vai rever isso e vai voltar tudo ao normal, não esquenta.
Afinal você é o Ogan de confiança dele, né ?
- Olha Baba eu já to é cheio disso de Ogan, eu toco candomblé
por prazer, nunca fui e não sou Ogan, nada contra mas sou feito de santo, no
meu caso Ogan é apelido e o senhor sabe.
Eu ri de Kelôlô, eu sabia muito bem que ele era feito de
santo e Ogan era um apelido assim como tantos por ai, mas uma coisa falava mais
alto, o caso da suspenção das atividades dele no terreiro. Como era possível seja
ele Ogan ou feito de santo ser suspenso das atividades religiosas ? O que o
santo do pai de santo falaria numa situação dessas ? Complicado. Mesmo que ele
tivesse levado a irmã de santo ao motel, não creio que a coisa chegasse a esse
ponto, aja visto que somos irmãos sim, mas não na concepção cristã do termo, e não
seria considerado incesto, creio eu.
Enfim, a coisa terminou sendo descoberta e Kelôlô voltou a
paz de seu terreiro tudo ficando como “dantes no quartel de Abrantes”
Baba Gilberto de Esu.
* Kelôlô (nome fictício) personagem de um caso real.
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